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Hélice continua, a solução “Bom Bril” (?)

A solução técnica de fundação profunda em estacas do tipo hélice continua monitorada foi introduzida no Brasil por volta de 1987 e, nessa época o seu processo executivo ainda não era totalmente monitorado. Ainda nesse período, os equipamentos disponíveis só permitiam a realização de estacas com diâmetros de 275, 350 e 425 mm e, com profundidade máxima de 15 metros o que limitava muito a aplicação desse tipo de estaca. Com o passar dos anos, a evolução tecnológica não só trouxe a possibilidade de realizar estacas de diâmetros e profundidades maiores, mas principalmente a possibilidade de se ter um maior controle no processo executivo de tal estaca garantindo uma maior qualidade e segurança. Sob tal as- pecto, há de se considerar que a monitoração executiva das estacas hélice contínua trouxe uma maior confiabilidade, segurança e economia tornando a estaca bastante difundida no mundo.

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A execução de estacas do tipo hélice contínua se divide basicamente em três etapas, sendo que na primeira etapa ocorre a perfuração do solo através de trado helicoidal de diâmetro previsto em projeto, já na segunda etapa ocorre a remoção da hélice juntamente com o solo escavado e simultaneamente é feita a concretagem e, pôr fim a terceira etapa consiste na colocação da armadura. Deve-se ressaltar que as três etapas de execução têm papéis importantes no desempenho e qualidade da estaca.

O sistema de monitoração consiste basicamente em um instrumento de medida constituído de um com- putador e alguns sensores instalados em determinados locais da máquina (perfuratriz) que medem basi- camente: profundidade, tempo de execução, inclinação da torre, velocidade de penetração e de rotação do trado, velocidade de extração, torque (?) e por fim volume e pressão de concreto. Esses parâmetros são fornecidos ao operador no instante da execução, através do monitor que se encontra na cabine de operação. É importante ressaltar a necessidade de periodicamente avaliar os sensores para que não haja risco de serem geradas informações falsas. Ao fim do processo executivo são recolhidos os dados obtidos no campo e através de um software gera-se um relatório com todos os dados anteriormente mencionados.

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Como se pode observar, aparentemente tudo parece estar totalmente controlado e com garantia plena de que nenhum eventual problema possa ocorrer. Em síntese, elevada tecnologia associada a elevada produtividade e muito marketing envolvido em toda essa solução técnica de engenharia, acabam por resultar inúmeras frases de impacto como meras estratégias comerciais, dentre as quais citem-se:

  • Garantia de qualidade do fuste mesmo em perfurações submersas, desde que se controle adequada- mente a velocidade do trado e pressões sempre positivas na concretagem.
  • Alta produtividade comparada a outros tipos de estacas de fundação.
  • Alta capacidade de carga das estacas (o que diminui o tamanho dos blocos de coroamento);
  • Monitoramento eletrônico da qualidade das estacas (controle da profundidade, inclinação e verticali- zação do trado helicoidal, velocidade de rotação, etc.).

Obviamente, por mera questão de bom senso, há de se ponderar na justa medida que nenhuma solução técnica de Engenharia de Fundações resolve todos os problemas (tipo Bom Bril com 1.001 utilidades). Inúmeras são as frases de impacto utilizadas rotineiramente como estratégias de marketing comercial para que essa solução técnica de fundações seja adotada em detrimento de inúmeras outras já ampla- mente consagradas e igualmente satisfatórias para determinada obra e em determinado local, porém na grande maioria das vezes, alguns meros detalhes não são observados e que, muitas vezes podem se transformar em futuros problemas de dimensões imensuráveis, pois tratam-se de verdadeiros problemas sorrateiros. Avaliemos então, de maneira mais aprofundada, algumas dessas situações, em especifico para o caso das Estacas Hélice Continua Monitoradas.

De fato, as perfuratrizes que executam estacas do tipo Hélice Continua Monitorada apresentaram no decorrer do tempo uma grande evolução quanto ao desempenho para a finalidade que foram desenvol- vidas. Ocorre que, embora todos esses equipamentos até possuam um sistema de monitoramento ele- trônico do processo executivo, isso é feito de forma indireta, ou seja, tudo se processa fora das estacas, uma vez que todos os sensores envolvidos nesse processo de monitoramento são instalados em deter- minados locais da perfuratriz e não nas estacas propriamente ditas. Assim sendo, pode-se afirmar que tal tipo de controle é sempre indireto e, de certa maneira, aproximado e/ou subjetivo. Vejamos, por exem- plo, algumas dessas medidas são feitas tendo por parâmetros o que determinado sensor instalado em determinado local da perfuratriz capta naquele instante e nunca posteriormente. Assim temos por exem- plo, um determinado volume de concreto foi registrado pela passagem por determinado sensor e, através de informações inseridas pelo operador da perfuratriz no sistema de controle (dimensões da estaca, por exemplo), “sugere-se” de forma gráfica que as dimensões da referida estaca são aproximadamente aque- las ali registradas graficamente, o sobre consumo (overbreack) é aproximadamente X% em relação ao volume nominal que seria esperado para tal estaca (área de secção x comprimento escavado). Obvia- mente que, tal sensor registrou corretamente a informação que por ele passou e, a transmitiu ao sistema eletrônico de controle, porém posteriormente à essa passagem da informação pelo referido sensor, muita coisa pode ocorrer até que a estaca realmente seja considerada apta a servir como elemento de fundação profunda. Sob tal aspecto, vejamos duas situações que até ocorrem, muitas vezes sem a percepção de que executa tal solução de fundação, e que, são verdadeiros problemas sorrateiros.

Situação A: Concretagem das estacas até o nível do terreno (cota de apoio da perfuratriz):

A Norma Brasileira de Fundações (ABNT NBR 6122/2019) em seu Anexo N5 (Pág. 90) apresenta a se- guinte consideração: “A concretagem deve ser executada até a superfície do terreno”.

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Muitas vezes nos deparamos com situações em que determinados clientes e até mesmo alguns projetis- tas, orientam que a concretagem das estacas seja feita até determinado nível abaixo da cota de apoio da perfuratriz, objetivando otimizar o posterior arrasamento das estacas e economizar o concreto excedente entre a cota dos blocos de coroamento e o nível do terreno. Tal procedimento não é permitido por Norma Técnica, pois faz com que possibilite a ocorrência do seccionamento do fuste das estacas já estando concretadas.

Fisicamente o que ocorre é que, estando o concreto ainda fluido e já registrado no respectivo sensor por onde passou, “atestando (?)” graficamente que até então a referida estaca está perfeitamente integra, ao se puxar posteriormente o trado carregado de solo, cria-se um verdadeiro “efeito pistão hi- dráulico” na estaca (semelhante a um êmbolo), provocando pressões negativas em determinados pontos da seção transversal já concretada e que, jamais poderiam ser captadas por algum sensor, pois todos os sensores estão acoplados na perfuratriz e não estaca propriamente dita. Em síntese, os sensores captam as informações que por eles passam e nunca o que ocorre posteriormente. Eis uma situação que certamente não se torna possível a detecção através das informações obtidas grafi- camente através dos registros dos sensores.

Situação B: Concretagem em solos que apresentam extensas camadas de baixa resistência:

Não raras as vezes, observam-se projetos de estacas tipo Hélice Continua Monitorada elaborados com estacas longas, esbeltas e perfuradas em solos que apresentam extensas camadas de solos de baixa resistência (muito moles ou fofos) situadas alternadamente sob camadas de solos de maior resistência (compactos ou rijos/duros). Nessas condições, embora até seja mantida a pressão de concretagem sempre positiva e devidamente registrada nos respectivos sensores, não raras as vezes ocorre seccionamento de fustes após a concretagem das estacas e, pior que isso, sem possibilidade de identificação previa por parte do executor das estacas. Obviamente por mera questão de bom senso, não parece sequer razoável projetar-se estacas sob tais condições e, pior ainda, executar-se.

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Em condições geotécnicas semelhantes às aqui representadas, não raras as vezes ocorre secciona- mento de parte do fuste em decorrência do carregamento provocado pela massa de concreto si- tuada na camada superior (mais resistente), pressionando assim a camada de concreto ainda mole e situada mais abaixo (na camada mole ou fofa), deslocando-a para baixo e também para as late- rais, o que acaba por resultar no seccionamento do fuste, em geral na transição entre a camada superior (mais resistente) e a camada inferior (menos resistente). Esse comportamento assemelha- se a um grande Slump Test, em que ao se remover para cima o cone (ou o trado), o concreto ainda fluido situado em seu interior, adensa-se para a parte inferior em decorrência da sobrecarga provocada pelo seu peso próprio por não haver confinamento lateral que possibilite sua estabilização. Não há como detectar previamente a ocorrência de tal problema, pois também nestes casos, os sensores regis- traram previamente a passagem do concreto até então e, “qualificaram as estacas” como integras.

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Como se pode observar, embora a solução de fundação profunda em estacas do tipo Hélice Continua Monitorada, em determinadas condições de execução até se constitua uma boa solução técnica de en- genharia, semelhante a inúmeras outras boas alternativas, também apresenta limitações. Não se pode admitir que essa solução seja colocada em algum tipo de “condição de superioridade” em detri- mento de inúmeras outras boas alternativas, condição essa quase sempre embasada por argu- mentos que na grande maioria das vezes não se fundamentam e até mesmo conflitam com boas técnicas. Toda solução técnica de Engenharia de Fundações possui aspectos positivos e negati- vos e, não existe nenhuma solução tipo Bom Bril que, tenha mil e uma utilidades, que solucione absolutamente tudo e não apresente nenhum problema. Ainda assim, por simples efeito comparativo às estacas tipo pré-fabricadas que possibilitam controle de qualidade total e individual de cada elemento cravado, desde a sua fabricação até sua cravação, atestando inclusive a capacidade de carga sob o aspecto geotécnico (interação estaca x solo), a solução em estacas do tipo Hélice Continua Monito- rada não apresenta tal condição. Na realidade, neste caso, monitora-se QUASE tudo e não se con- trola quase nada. FICA A DICA PARA A REFLEXÃO!!!!

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